VAMOS SENTIR DE PERTO A LÍNGUA EM MOVIMENTO

A fala é o foco para a percepção do balanço da língua. De todas as coisas que expressamos oralmente, somente uma ínfima parte é apreendida pelos dicionários e, acreditem, muitas estão destinadas a um obscuro repouso... é isso mesmo! ao asilo das palavras. Não adianta querer ressucitar defunto, dizendo que o latim não morreu, que está vivíssimo entre nós ou com roupagens novas. Morreu sim, e está enterradinho da Silva!Está bem, pode até ter reencarnado, mas ganhou nova identidade... e nova alma! A língua viva está em movimento, na boca do povo, como dizia o saudoso Souto Maior. Pergunto: A esse uso, chamaremos ERRO? Talvez DESVIO? No uso, ela transforma-se e podemos chamar isso de VARIAÇÃO!

sábado, 10 de julho de 2010

A IMPORTÂNCIA DO ATO DE LER

Entrevistada: Solange Carvalho (UFPE/Fundaj)
Entrevistadora: Madeleine Barros Agrelli (UVA)

1- Até que ponto um reduzido grau de leitura pode interferir na vida de um indivíduo?
R- Precisar o grau e a interferência na vida do indivíduo não é tarefa simples, além do mais a necessidade da leitura (no caso de livros) vai depender de vários fatores, a exemplo das atividades profissionais que exerça na sociedade. Se para sobreviver a contento, baste ao indivíduo fazer a leitura da direção de um ônibus, uma sinalização de trânsito, ou mesmo, apenas o próprio nome, o seu grau de leitura não precisa ser tão elevado. Entretanto se estivermos falando de leitura de mundo... aí adentramos por um outro viés.

2 -Você acha que qualquer leitura é construtiva para o processo de apropriação do saber? Justifique.
R- Isso é relativo. Vai depender do tipo de conhecimento que se queira apropriar. Segundo a Bíblia, o apóstolo Paulo afirmou que se deveria conhecer de tudo e reter o que era bom. Assim se dá com a leitura, podemos ler de tudo, sempre teremos o que aprender, não podemos imaginar que não haja o que aprender na leitura de determinado gênero. A questão é o foco de interesse, uma empresária feminista pode não gostar de livros de receitas, já uma dona de casa, dificilmente deixará de ter um exemplar em sua estante. Acho que aprender nunca é demais, como dizia o grande educador Paulo Freyre é preciso que quem sabe, saiba sobretudo que ninguém sabe tudo, e, que ninguém tudo ignora, no seu livro Pedagogia do Oprimido. O fato é que, se nós alimentamos preconceitos, e o fazemos, deixamos de nos interessar por determinadas leituras que somente nos enriqueceria, em termos de aquisição cultural. Em termos de apropriação do saber, todo tipo de leitura é válido, a depender do foco de interesse, entretanto, algumas leituras tem seu aspecto negativo quando interfere na ortografia por exemplo, se temos o costume de ler autores desavisados do ponto de vista da escrita, isso pode ter uma interferência negativa nesse aspecto.

3- Você concorda com a professora Nelly de Carvalho (UFPE) quando diz: “Quem ler mais, erra menos? Em que aspecto?
R- Plenamente! Nossa mente funciona como uma câmara fotográfica, quando lemos, absorvemos as formas como são escritas as palavras, enriquecemos nosso acervo lexical. Podemos sequer lembrar a regra ortográfica que implica em determinado lexema, mas certamente saberemos como escrevê-lo, pois está fotografado lá no aparato mental.

4- Em que aspecto pode-se dizer que a leitura interfere na escrita?
R- A leitura interfere na escrita em vários aspectos; na ortografia, como já mencionado na questão anterior, no estilo absorvido de determinado autor, nos termos relacionais usuais, no conteúdo, pois quem ler mais passa a ter mais ideias, a partir da leitura de outros pontos de vista, o leitor vai formulando os seus próprios pontos de vista. O indivíduo que não tem o hábito de ler, quando escreve terá o hábito de escrever fonologicamente, ou seja, da maneira como fala, e, como sabemos, a linguagem escrita diverge da linguagem falada. A linguagem falada tem o recurso do extralinguístico para auxiliar na comunicação, ou seja, um gesto, um olhar de aprovação ou reprovação, um morder de lábios. O falante vai fornecendo pistas de contextualização que auxilia o seu interlocutor interagir, fazer a leitura dessas sinalizações e até mudar de atitude...a linguagem escrita, não tem o auxílio dos fatores extralinguísticos, por isso tudo que se quer dizer, é preciso ser dito, do contrário não se fará entender. A leitura vai nos dar o conteúdo, por isso quando escrevemos, fazemos citações, referenciamos e usamos a intertextualidade, um dos critérios da textualidade. Somente quem tem o hábito de ler pode lançar mão de tais recursos.

5- O que significa a seguinte assertiva sobre o gênero HQ: “são atrofiadores de mentes”. Você concorda? Comente os aspectos positivos e/ou os negativos.
R- Não sou tão radical a esse ponto, mas compreendo o que o autor dessa assertiva quis dizer. Se viciamos a nossa mente a ler somente com o recurso da visualização, estamos nos condicionando a repugnar qualquer leitura que não tenha imagem. Outro ponto a ser discutido é que os elaboradores de tais textos, não têm a preocupação necessária com a linguagem escrita, com a normatização da língua. Temos por exemplo uma crítica a fazer nas falas do personagem Chico Bento, cujo exagero em pontuar seus erros na escrita não condizem com a realidade da própria escrita. Chico Bento jamais pode ter problema com acentuação, pois ele fala acentuadamente, mas quem escreve, com a intenção de mostrar que ele “fala errado”, não coloca os acentos gráficos nas palavras, ou, mais absurdo ainda, registram problemas de ortografia da fala de Chico Bento, um exemplo grosseiro, se o personagem pronuncia uma palavra com ch, o escritor grafa com x, só que do ponto de vista fonético tais fonemas são idênticos, o dígrafo ch tem o som de x, se ele diz “cheiro”, vão escrever xero. Enfim, há um exagero que pode ser prejudicial aos leitores que estão no processo de aquisição da linguagem. Já as tiras de Mafalda são interessantíssimas, criativas e inteligentes. De modo que os aspectos positivos desse gênero textual estão na fruição e na criatividade de algumas tiras e também, no gosto pela leitura, quando se está ainda no início do processo. Os negativos, como já foram vistos estão relacionados ao condicionamento visual e às questões ortográficas.

6- Qual a relação entre letramento e a leitura de impressos?
R- Uma pessoa que ler muitos impressos tem hábito de leitura. Inferimos disso que ela naturalmente tem grau elevado de letramento, posto que adquire novos saberes através da leitura. Não podemos dizer, entretanto, que o letramento está relacionado apenas a esse tipo de conhecimento absorvido por livros, revistas etc, mas a vivências de mundo, conhecimentos partilhados, experiências compartilhadas, afinal, a vida é uma grande escola, não sabemos como levantar um muro de arrimo, mas o pedreiro tem letramento suficiente para isso; podemos não saber como fazer uma roupa, mas um alfaiate tem todas as técnicas para fazê-la. Há pessoas que não foram à escola, mas tem um elevado grau de letramento, por conta da leitura que faz do mundo. Paulo Freire também já disse que “a leitura do mundo precede a leitura da palavra”, tal leitura contribui para a formação do senso crítico, e isso deve ser considerado.

7- A leitura de hipertextos pode ser muito construtiva para o processo de aquisição de conhecimento pelo aluno. Comente essa afirmativa.
R- Acredito que a leitura de hipertexto é a nova ordem da educação no mundo informatizado. Não há como se fazer uma leitura linear no hipertexto, pois sempre haverá os links para direcionar o leitor para onde ele quiser ir. Há aquelas leituras em impressos que levam o leitor a buscar outros conhecimentos, em enciclopédias, por exemplo, esse tipo de leitura também não é linear. A Bíblia, por exemplo, não pode ser compreendida linearmente, há sempre a necessidade de se buscar a relação em outro texto dela mesmo, a leitura da bíblia é, por conseguinte, hipertextual. A não-linearidade do hipertexto exige do aprendiz um esforço maior para buscar outros entendimentos, sem dúvida, essa busca enriquece o processo de ensino-aprendizagem, o aluno não recebe de mão beijada a interpretação textual, ele vai fazer a sua própria interpretação, a partir de suas buscas. Isso é muito construtivo para o processo educacional. A mídia eletrônica veio para facilitar esse esforço do aluno pesquisador, o aluno que quer saber sempre um pouco mais. Fora de controle. A aprendizagem do leitor hipertextual está fora do controle do professor e isso (isto) é muito positivo.

8- O que é falar bem? Você acha que tem relação direta com a leitura?
R- No meu ponto de vista, falar bem é se comunicar bem, é saber se comunicar pelos diversos gêneros textuais.

9- Que estratégias motivacionais você usa com seus alunos como incentivo à leitura?
R- Distribuo com eles vários livros, coloco sobre o birô, peço que eles leiam a orelha do livro, o resumo da história e escolham para ler aquele cuja história mais o interessou. Ninguém fica de fora da atividade, pois todos têm que contar a história que leu para os colegas e para mim. Outra estratégia é fazer uma leitura coletiva de um único livro, eles levam para casa para lerem três capítulos, quando chegam na sala, comentamos, depois leio com eles mais um capítulo ou dois, a depender do tamanho do capítulo, depois peço para eles levarem para casa para lerem mais três capítulos, depois aumentamos até concluir o livro. Seleciono o final das próximas aulas para apresentação de um por um. Sempre tem aqueles espertos que vão querer driblar inventando a história, aí terá que exercer o seu poder criativo...

10- A sala de aula é o ambiente propício para o aluno criar o hábito de ler ou hábito deve ser cultivado em outro espaço, a exemplo da leitura diária em casa?
R- Como dissemos na questão anterior, pode ser germinado na escola para então ser cultivado em casa. A escola é um ambiente propício para criar atmosfera de leitura, sobretudo quando a questão é aluno carente de comunidade problemática, uma vez que nesse caso o ambiente no lar não é favorável ao processamento cognitivo do aluno. Depois que a semente estiver plantada, pode ter certeza que ela germinará se for regada, há algumas que não são regadas, mas sobrevivem ainda assim, portanto é importante que não seja arrancada. Daí a importância da escola que pode ser a terra que a acolheu.

2 comentários:

  1. A professora Solange Carvalho é muito esclarecida quanto ao processo de ensino-aprendizagem. Fez comentários realmente pertinentes que os professores devem levar os alunos em relação à motivação à leitura.

    Adriana

    ResponderExcluir
  2. É verdade professora Solange. Nos professores temos que motivar não só os alunos mais como todo o ser humano para o habito da leitura. Pois quem ler sabe mais, escreve melhor, entre outras coisas. Parabéns pelo Blog.. muito bom.

    ResponderExcluir